Olá pessoal!
Após alguns anos sem publicar, retomo o blog com nova linha editorial. E começo falando dos estilos de cerveja que têm feito a cabeça dos cervejeiros mundo afora: as New England IPAs, as Pastry Stouts e as American Sours.
A New England IPA (abreviatura NE IPA), Vermont IPA, Juicy IPA ou ainda Hazy IPA é um estilo de IPA onde algumas características são determinantes: aparência bastante turva, textura densa e macia, aroma de lúpulo extremamente pronunciado e amargor rápido, agradável (sem o famigerado harsh, pelo menos é o que se espera dos bons exemplares) e geralmente não muito intenso. Isso se dá pelo uso de ingredientes como trigo (maltado ou não), aveia e leveduras que ficaram célebres por ajudar no perfil frutado e tropical dessas IPAs, como a Conan ou a Wyeast 1318 London Ale III, por exemplo. E, muito, mas muito lúpulo de perfil cítrico/tropical no whirlpool e no dry hopping, principalmente. Alguns dos varietais mais utilizados são o Citra, Mosaic, Galaxy, Simcoe e El Dorado, que geralmente trazem notas de manga, maracujá e demais frutas amarelas ou tropicais, e notas secundárias de frutas vermelhas, floral e resinoso. É importante que a cerveja tenha aparência e textura que lembre um suco de frutas, e não somente o aroma e sabor.
O estilo surgiu na Nova Inglaterra (daí o nome New England IPA), em estados como Vermont, Massachusetts e Maine, por exemplo. Podemos considerar a Heady Topper, da cervejaria The Alchemist, o rótulo pioneiro que, junto com a cervejaria Hill Farmstead, puxou a tendência para IPAs com ainda mais aroma e sabor de lúpulo e textura suculenta, independentemente de sua aparência final. Com o tempo, a aparência bem turva, que no início gerou polêmica, passou a ser perseguida pelas cervejarias.
Heady Topper fresquinha sorvida em um dos Bottle Shares feitos na Cervejaria Koala San Brew
As Pastry Stouts, Stouts com adjuntos ou Stouts de sobremesa são stouts que levam uma infinidade de ingredientes extras, geralmente com o intuito de harmonizar com as notas de café, chocolate e torrefação dos maltes escuros e tentar expandir as possibilidades de sabores oferecidos. Uma inspiração razoavelmente recente e que tem feito a cabeça de muita gente são as receitas inspiradas em sobremesas ou bebidas, como afogatto, tiramisù, cheesecake, etc. O uso de cafés especiais, nibs de cacau, favas de baunilha, diversos tipos de pimenta, maple (xarope de bordo), coco e diversos tipos de castanhas é muito comum, assim como o resgate recente do uso da lactose, açúcar do leite que, por não ser fermentável pelas leveduras de cerveja, aumenta o dulçor da cerveja, dando ainda mais sensação de “sobremesa alcoólica líquida”. E, não raro, isto ainda é aliado ao uso de barris de bourbon, whisky escocês, vinho do porto, jerez, calvados, rum e outros destilados, tudo para enriquecer e obter mais complexidade para o líquido negro.
O sucesso e as notas de avaliação dos degustadores são proporcionais, colocando várias destas cervejas no topo dos rankings de preferência dos cervejeiros, e alguns rótulos, por sua qualidade e raridade, são disputados à tapa por beer hunters, chegando a custar pequenas fortunas. Cervejarias como a sueca Omnipollo, a dinamarquesa Evil Twin e as americanas Angry Chair, Side Project, Toppling Goliath e Bottle Logic testam os limites destas combinações e, não raro, produzem verdadeiros ouros (negros) líquidos.
AnAngry Chair Rocky Road, Imperial Stout com favas de baunilha e nozes tostadas absolutamente acachapante.
Já as azedinhas têm ganho cada vez mais espaço, tanto na forma das tradicionais Lambics (principalmente as com adição de frutas) e Gueuzes belgas, quanto dos estilos alemães Gose e Berliner Weisse e, por fim, das American Sours, além das Saisons e Farmhouse Ales. Os norte americanos desenvolveram um estilo próprio de se fazer cerveja ácida e/ou selvagem, com resultados incríveis. Cervejarias como Side Project, De Garde, Jester King, Cascade e Crooked Stave entregam cervejas feitas com uma miríade de frutas, envelhecidas de diversas maneiras, e muitas vezes blendadas para atingir resultados ainda mais complexos. A qualidade e o nível de complexidade atingidos fazem com que elas sejam as cervejas mais valorizadas e disputadas do mercado cervejeiro hoje, juntamente com as RIS Barrel Aged. Posso afirmar sem sombra de dúvidas que as melhores cervejas que tomei ano passado foram algumas incríveis azedas e funkeiras que passaram pelo meu copo.
Almanac Grand Cru Red, Imperial Flanders Red Ale com uvas Zinfandel californianas, framboesas e favas de baunilha, envelhecida em barris de carvalho francês que continham vinho tinto. Talvez a melhor cerveja que bebi em 2017.
Notadamente, o mercado brasileiro não ficou desatento a estas tendências. Hoje praticamente toda cervejaria brasileira de ponta tem uma ou mais NE IPAs em seu portfólio, bem como alguma cerveja de pegada ácida, com especial preferência para as berliner weisse. Já contamos, inclusive, com belos exemplares de pastry stout, o que só deixa os beer geeks cada vez mais felizes.
Tendências são fenômenos extremamente rápidos e voláteis, e estar antenado é fundamental para usufruir o melhor do que a indústria cervejeira pode nos oferecer e, do ponto de vista de quem fabrica, manter-se relevante. Viajem, troquem informações e experiências, façam bottle shares à exaustão e lembrem-se da velha máxima: nada substitui as horas-copo.
Bem vindos de volta, caros amigos. Um brinde ao bate papo cervejeiro!
Ouvindo: Frank Sinatra – The Coffee Song